terça-feira, 22 de março de 2011

TRADUZIR-SE Ferreira Gullar

TRADUZIR-SE
Ferreira Gullar

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
_ que é uma questão
de vida ou morte _
será arte?

segunda-feira, 21 de março de 2011

QUAL O SENTIDO DE TANTAS TRAGÉDIAS QUE ACONTECEM?

QUAL O SENTIDO DE TANTAS TRAGÉDIAS QUE ACONTECEM?

por João Carlos Petrini, bispo de Camaçari (BA)

Nos dias passados aconteceu um dos terremotos mais fortes da história, seguido por um tsunami com ondas de 12 metros de altura que arrasou muitas cidades. Como se não bastasse, as usinas nucleares do Japão começaram a ter problemas de aquecimento e estão soltando perigosíssimas radiações. Por outro lado, no Brasil, chuvas intensas provocaram inundações com destruição e morte, antes na região serrana do Rio, agora em outros lugares do sul. Ao mesmo tempo, aumenta vertiginosamente a violência nas grandes cidades do Brasil, com numerosas mortes de jovens e adolescentes. O povo da Líbia passa por situação crítica bem como outros povos.

Essas situações estão provocando muita dor além das mortes, muito sofrimento. O pior que possa acontecer é que todo esse sofrimento permaneça sem sentido para nós, passando pela nossa vida apenas como emoções momentâneas que não mobilizam a inteligência para compreender e nem a fé para invocar a Misericórdia de Deus. Passamos então a acompanhar outros assuntos que a telinha nos apresenta para proporcionar a distração de que necessitamos.

A dor que essas tragédias provocam, no entanto, pode sacudir essa insensibilidade, pode nos tornar mais conscientes do limite que caracteriza nossa existência e mais cuidadosos e amorosos com as outras pessoas. Pode despertar em nós inteligência e realismo para reconhecer nossa condição de criaturas que procedem de um Mistério infinito, eterno, onipotente e criador, origem da nossa existência e de tudo o que existe. Este Mistério do qual dependemos continua a nos oferecer sua amizade, sua aliança, sua misericórdia e compaixão.

“Voltai para o Senhor, vosso Deus, ele é benigno e compassivo, paciente e cheio de misericórdia, inclinado a perdoar” (Joel, 2, 13).

Alguns se revoltam, pensando: Deus, se existe, é malvado, porque provoca essas tragédias. Mas Ele não quer para nós o mal e a morte, não se vinga de nossas maldades, não é o autor dessas tragédias. Ele abraça e toma para si nosso mal e nossa morte para vencê-los e quer doar a nós sua vida divina que vence a morte. Mas respeita a nossa liberdade que hoje parece ignorar outros bens além do lucro, do poder e da fama, passando por cima de tudo e de todos para perseguir essas metas. A quaresma nos convida a reconhecê-lo como Pai e a invocá-lo com sinceridade: Pai nosso, ...venha a nós o vosso reino de paz,seja feita a vossa vontade ... O pão nosso de cada dia dai-nos hoje. Perdoai as nossas ofensas, como nós perdoamos as dos outros. Não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Padre Aldo ensina

Padre Aldo nos lembra da verdadeira postura diante da vida e da morte.
Cartas do P.e Aldo 160

Asunción, 5 de setembro de 2010.


Caros amigos,
Eis-me de volta a casa. Os meus filhos muito felizes. Vejam o que uma menina me escreveu: “Quero dizer que estou feliz com o seu retorno. Que graça saber que você voltou. Senti muito a sua falta. Agora, não quero mais chamar você de Padre Aldo, mas de papai Aldo. Papai Aldo, você é o melhor papai e eu o amo muito, e fico feliz por saber que você quer o meu bem, porque nem minha própria família me trata tão bem como me tratam na Casinha de Belém, que é a minha verdadeira família. Elizabeth”.
Deixo a vocês imaginarem o que significa para mim ver que tão logo pisei o solo dessa terra todos vieram ao meu encontro, dizendo: “Finalmente”. A minha alegria chegou às estrelas, mesmo porque o mais violento deles (há um tempo atrás), mostrando-me o boletim do segundo trimestre, tinha tirado 5 em todas as matérias, que é a nota máxima no Paraguai. Milagre do amor – “eu sou Tu que me fazes” – que penetra as fibras mais íntimas das minhas crianças e as muda.
Ao mesmo tempo, não vi mais o pequeno Alberto (vejam a foto), de dois anos, que morreu durante a minha ausência, deixando-nos todos cheios de dor.
Assim também, não encontrei mais o jovem Abraão, que tinha se casado antes de eu partir, doente de AIDS e com um câncer. Eu o havia deixado feliz, em lua de mel, na clinica, obviamente junto com Susana, a garota com a qual convivia e que tinha contagiado com AIDS e com a qual se tinha casado antes que eu partisse (vejam as fotos).
Ela me esperava com sua carga de amor e dor. Deu-me este bilhete comovente que é um soco no estômago, bilhete comovente, particularmente, para quem tem problemas (frequentemente infantis) de relacionamento no matrimônio: “Abraão se realizou como cristão e eu estou em paz, porque graças à AIDS pude conhecer a Deus, toda a Sua bondade, todo o Seu amor. Agora, fiquei sozinha, mas com um grande desejo de continuar vivendo, lutando por um novo amanhecer. Aqui, na Clínica Divina Providência, conheci pessoas capazes de tanto amor que espero que existam outros lugares como este para todos os doentes como eu, para que possam conhecer a Jesus. Tenho AIDS e não tenho medo dela. Não tenho medo de contar a minha história, porque encontrei a Jesus. Os meus pais, desde quando souberam disso, estão sofrendo muito, mas eu lhes digo, como a todos, que a morte é uma realidade que todos devemos enfrentar e, por isso, somos chamados a nos preparar bem, na certeza de que Deus nosso Pai está se preocupando por nós”.
Amigos, isto é o cristianismo, esta é a fé. Se os nossos olhos estivessem fixos nestes fatos, como seríamos livres e capazes de gratuidade!
Carrón, introduzindo o encontro de responsáveis em La Thuile nos chamava a atenção, na primeira noite, para a conversão e lembrava as palavras do profeta: “Amei-te com um amor eterno, atraindo-te para mim, tendo piedade do teu nada”.
Tudo o que acontece aqui é esta consciência, que, porém (isto é essencial e devemos pedir a Nossa Senhora para entender isso) pode acontecer, como vi em tantas pessoas humildes e que seguem a Carrón como filhos, olhando como ele vive esta certeza, mesmo na Itália. Ao invés, quem, estando na Itália não a vive, não a viverá em lugar algum.
Rezem por mim e por nós. É o gesto mais belo de amizade e somente disso temos necessidade porque, com isso, Jesus nos dá o resto.
Com afeto.
Padre Aldo
Postado por p@checo às 19:31 0 comentários Links para esta postagem


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Este texto foi extraído do blog Mosaico, mantido por Paulo R. A. Pacheco.
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